Enquanto surfava pela internet,
fingindo que procurava alguma coisa importante, me concentrando muito sério, de
cada vez que entrava inadvertidamente nalgum site “’proibido”, para desviar a
atenção de quem tentava monitorar o conteúdo das páginas que eu visitava, pela
expressão do meu rosto; tropecei numa notícia desoladora num site de notícias:
“Fracasso escolar e vergonha levam estudantes ao suicídio na China”. Fiquei ainda mais
pasmo com as estatísticas que o artigo apresentava; 287 mil pessoas se suicidam anualmente naquele país. E tudo
por quê?
Fracasso!
Simples assim.
Essas
pessoas se sentiam fracassadas, algumas delas eram adultos, jovens e até crianças
e adolescentes. Pensei comigo mesmo, aí está, uma das consequências dessa
história de valorizar os acertos mais do que os erros, premiar as conquistas
que sabem à vitória e emergem do nosso atroz quotidiano no qual somos obrigados
a aniquilar colegas, amigos, familiares, enfim, pessoas que se deixássemos, com
certeza acrescentariam testemunhos interessantes às nossas vidas descoloridas,
por causa da ganância obsessiva com o primeiro lugar.
Somos
premiados para não fracassar, ou pior, para fracassar jamais! Um imperativo tão
custoso quanto fatídico, como no caso dos exemplos degradantes que a notícia
nos reporta. Ali falava da China, mas não faltam exemplos nos vários recantos
do mundo.
Estes suicídios deixam uma
clara e assombrosa mensagem, a respeito do que temos produzido através daquelas
práticas sociais que sancionam comportamentos como a competitividade, a
agressividade, a busca de resultados sem preocupação com os meios, a exploração
até a exaustão das potencialidades das pessoas em nome da necessidade de
acompanhar as transformações sociotécnicas (como se isso fosse possível de
alguma forma), a abreviação da infância, ou sua substituição por uma vida
prematuramente adulta, etc., aliás, nossas crianças aprendem cedo que fracassar
é garantir de modo inescrupuloso, sua exclusão do mundo social. Infelizmente, é
neste ínterim que também acaba se criando a oportunidade ideal para os palpites
pseudocientíficos dos autores da literatura de autoajuda, que fazem proliferar
títulos como: 8 passos para o sucesso, 10 dicas para não fracassar, Em busca da
excelência, etc., prestando um desserviço ao ensinar fórmulas reducionista
sobre tudo, como se a vida se restringisse a medidas ortopédicas. Perdemos
tempo procurando pílulas que aumentam a produtividade, diminuem nossa
sensibilidade aos problemas pessoais e coletivos; tudo em vista de uma coisa
chamada de sucesso.
Por quê o
sucesso é tão valorizado? Qual o problema de errar em vez de acertar? Aliás,
errar às vezes resulta em descobertas importantes, como a história nos tem
ensinado.
O que tem
de saudável, por exemplo, fazer os pais de primeira viagem pensarem que deviam
saber tudo sobre como cuidar dos filhos recém-nascidos, nos esquecendo
convenientemente de sua inexperiência, deixando-os desesperados por que não
sabem nada sobre crianças e desconsiderando que este é um aprendizado que se
faz na prática? Ou que vantagem existe em sobrecarregar nossas crianças ainda
no jardim de infância com atividades que exigem uma destreza injustamente maior
do que aquela que eles são capazes de demonstrar, apenas por causa dos
demagogos que apregoam o sucesso a qualquer custo?
As
notícias sobre suicídio de jovens devido ao suposto fracasso em várias esferas
da vida demonstram de forma assustadora as consequências de uma ditadura
irrefletida do sucesso.
O custo é elevado,
está visto e manter-se omisso em relação às perdas, tem custado um preço alto
para muitas pessoas e não raro a própria vida!