domingo, 3 de junho de 2018

Em Angola a polícia mata e o cidadão festeja

Na minha opinião esta seria uma forma de se deveria noticiar o caso do assassinato em que envolveu-se o agente dos Serviços de Investigação Criminal (SIC).
Para pensarmos sobre isso convido o leitor a acompanhar-me numa tentativa de reflexão sobre alguns dos vários aspectos que encerra a questão. Mas começo por avisar que a digressão necessária não é tão simples quanto pode parecer!

   1. Para ser considerada culpada, a pessoa tem antes que ser julgada e condenada, não esqueçamos que a nossa lei prevê a presunção de inocência.
     
    2. Há um problema sério no facto de um assassinato com 5 tiros à queima roupa estar a ser tratado com uma espécie de entusiasmo felicitante por nós. Afinal estamos a festejar a morte de alguém como se tivéssemos apanhado dinheiro. Ainda que como se diga haver a suspeita de preparação para o cometimento de um crime, o vídeo gravado mostra que no momento da execução o jovem estava imobilizado no chão e já não constituía, portanto, ameaça para ninguém e muito menos para um agente armado.
   
   3. A exultação da população manifesta nas redes sociais, pode ser compreendida pela crescente percepção do aumento da violência, levando-as a cair na armadilha de aceitar soluções rasas e superficiais como o assassinato, sem avaliar outros elementos produtores dessa sensação de insegurança, ou seja, sem olhar para as questões de fundo e sem procurar soluções mais cuidadosas e sobretudo sem pensar nas implicações de uma polícia matadora.

     4.   Fica invisibilizado nessa alegria momentânea  que no fundo o que se está a fazer é permitir à polícia actuar de maneira abusiva  não somente contra aqueles que tenham supostamente cometido algum acto criminoso, mas sobre qualquer cidadão que tenha o azar de se deparar com a imposição de acções violentas da polícia em situações que muitas vezes não representam perigo real para o agente.

Quanto à execução, ainda é preciso dizer como alguns veículos já lembraram, que essa é uma prática normal dos nossos agentes PÚBLICOS de segurança e o jornalista Rafael Marques o demonstra em seu extenso Relatório sobre execuções sumárias em Luanda, que cobre os anos de 2016 e 2017.
Deste modo, quando festejarmos novamente a EXECUÇÃO de um suposto marginal, lembremo-nos que esse modo de funcionamento não é apenas extensivo aos supostos marginais e mais rápido de que se imagina há de atingir qualquer um de nós. 

Intertexto
Primeiro levaram os negros
Mas não me importei com isso
Eu não era negro

Em seguida levaram alguns operários
Mas não me importei com isso
Eu também não era operário

 Depois prenderam os miseráveis
Mas não me importei com isso
Porque eu não sou miserável

Depois agarraram uns desempregados
Mas como tenho meu emprego
Também não me importei

Agora estão me levando
Mas já é tarde.
Como eu não me importei com ninguém
Ninguém se importa comigo.