domingo, 30 de setembro de 2012

Homens (machos) à deriva


Hoje os homens vivem “tempos difíceis de manejar”, pois ser macho já não é tão fácil quanto antes, quando não existia essa proliferação de movimentos, que criminalizam quase tudo o que representa ser homem, tornando as coisas de que antes nos orgulhávamos em sua maioria, coisas vergonhosas. Perdemos as definições claras, que aprendíamos ainda meninos e as liberdades que se supunham exclusivas de um clube (de indivíduos falocêntricos) que podia praguejar sem recriminações ou pesos de consciência, criar arruaças para provar sua machesa assegurando aos adultos que estava a aprender bem a coisa e xingar para expressar seus confusos sentimentos, aliás, sentimentos era algo que quase não fazia parte de nosso rústico vocabulário, por isso sabíamos, quase intuitivamente, que em parte, ser homem era mostrar ao mínimo o que sentíamos, já que frases como: um homem nunca chora, por mais dura que seja a dor, haviam sido sistematicamente marteladas em nossas cabeças diminuindo já desde essa altura a possibilidade de tê-las um pouco mais arejadas. Porém, hoje, a maioria de nós chora pior que um recém nascido já que a certeza de estarmos sem nosso antigo norte é cada vez mais forte. 
Naufragamos em algum lugar muito estranho e estamos à deriva, vivendo  simultaneamente (mesmo sem coragem de admitir) o medo de nunca mais encontrarmos terra firme e a angústia de pousarmos em algum pântano desconcertantemente arenoso e complexo demais para nossa geografia masculina. Percebemos finalmente, que negligenciamos a crise das mulheres por séculos, deixando-as debaterem-se na (re)conquista de seus lugares e o custo disso chega agora em que experimentamos nós mesmos nossa própria crise, a qual o lendário orgulho masculino com certeza não será suficiente para ajudar-nos ultrapassá-la, pois, as antigas referências já não valem mais para afirmar nossos supostos valores e as novas, tardam a chegar. Por isso, restam-nos poucas soluções, além de tropeçarmos constantemente numa identidade caduca de Homem hetero, que perdeu a maior parte de sua tangibilidade.

quarta-feira, 12 de setembro de 2012

Praça da miséria

Como sempre, às manhãs de sábado eram as alturas que as pessoas usavam como desculpa para visitar os populosos mercados, conhecidos no seio popular com praças. Não muito porque era o nome que melhor se adequava, mas principalmente, devido ao fraco vocabulário das pessoas humildes. Assim, na ausência de expressões linguisticamente mais ricas, colava-se na boca do povo, majoritariamente analfabeto, o simples “vou na praça”, que servia para expressar a assustadora diversidade de utilidades, que aquele espaço simultaneamente informal, ilegal e marginal, possuía. Por isso, engana-se quem imagina esses lugares como sendo apenas espaços de venda de bens e serviços, que mantinham à duras penas a já difícil subsistência de milhares  de cidadãos, expatriados de quaisquer direitos sociais e civis, salvo quando sua opinião valesse  o voto, que faria a diferença entre uma monarquia ilegal e uma série de Promessas de Governo com uma competência duvidosa, devido aos interesses  escusos, que sustentavam seus discursos pretensamente patrióticos. Essas praças, como queríamos dizer, expunham também uma forma de vida característica de um grupo, que está condenado a conformar-se com um distanciamento social crônico e desnecessário entre cidadãos de uma mesma nação, pois estavam fadados a viver como nacionais de 3ª classe, afinal, jamais lhes tinha sido explicado, quê “estória” é essa de igualdade de oportunidades, direitos civis, dignidade social, etc., todos conceitos muito difíceis de serem entendidos por essas pessoas, pois eram tão abstratos e tão difíceis de ilustrar quanto 3 refeições por dia, um salário, ou, um emprego de fato, já que as únicas coisas que estavam acostumadas a viver reproduziam uma taxa de desemprego altíssima, condições de vida precárias e uma impossibilidade dolorosa de sonhar com dias melhores.
Então, as grandes praças, eram o remendo possível de uma situação impossível, pois aceitava sem preconceitos, que por lá proliferassem todos, comprando, vendendo, trocando e enganando, sempre que possível para fermentar o lucro apertado, que oferecia o monte de tomate estragado de tanto calor, de 5 por 300,00, a carne coberta de tanta mosca que os clientes preferiam não ver, a roupa que se fingia nova em folha, para bem da transação e que guardava histórias desinteressadas sobre o quotidiano das pessoas que pululavam pelo mercado por verdadeira necessidade, ou apenas por interesse turístico, que muitas vezes saia mais caro do que os pulas alheios esperavam, roubados mesmo nas barbas de uma polícia impávida, que acostumou-se a observar, mais do que a agir. Ninguém sabe se por covardia, ou por conluio com os ladrões que se dividiam em bandos altamente organizados para garantir resultados cada vez mais eficazes, deixando assim, que suas histórias de fracassos individuais se diluíssem numa espécie de sucessos coletivos, mesmo que todo aquele esforço e júbilo terminasse apenas em algumas cervejas, tomadas na barraca de uma Tia Maria qualquer, que guardava o dinheiro evitando perguntas, para não se chatear com a obviedade das respostas.