sábado, 25 de agosto de 2012

Departamento de perguntas idiotas


Imagine uma pessoa estatelada no chão, depois de uma queda pública espalhafatosa, quando aparece um Zé da Esquina, que pergunta despropositadamente:
- E então, caíste? Como se tudo que tinha acontecido pudesse ter sido um teatrinho feito apenas para atrair a atenção de um bando de desconhecidos. Claro que na maioria destes casos você está tão desmoralizado, que no máximo apenas te vai sobrar inspiração para dirigir-lhe um olhar fulminante. E então, depois de passado o susto lá vem silenciosamente a resposta, que gostarias de ter dado naquela altura:
- Não. Estava somente a experimentar uns malabarismos e a explorar as limitações  mecânicas do meu corpo!
Imagino que muitos, já tiveram aquela vontade quase assassina de responder com tolerância zero à esse tipo de pergunta. Afinal, o “tipo” já viu a obviedade da resposta e mesmo assim ainda te provoca com aquela pergunta asquerosamente imbecil e não me digam que é por boa educação, porque nesse caso não perguntaria, ajudaria a levantar, ou melhor ainda, cairia também, só para mostrar solidariedade. Em minha opinião, é mesmo imbecilidade, perguntar a que horas sai o autocarro (ônibus) das sete, como se existisse algum planeta em que ele sai às oito, sem deixar de ser “o das sete”, por este motivo, meu amigo não poupa impropérios quando alguém liga para o seu celular, perguntando pelo dono do telemóvel. Mas claro que às vezes ele abre um parêntesis de condescendência à deselegância da pergunta:
- Não, é que ele deixou o telemóvel na praça, porque está fazendo campanha contra a descriminação à perguntas esdrúxulas!
Mas é também verdade, que nós mesmos não somos imunes a isso e às vezes só nos apercebemos da redondeza da nossa bem intencionada pergunta, depois de uma resposta brincalhona de um sicrano qualquer:
- Não, não estou aqui, é apenas uma projeção holográfica, pois neste momento estou gozando umas férias no Havaí, apreciando a brisa que me chega do vai e vem preguiçoso das ondas.
E uma resposta tão criativa quanto essa dói tanto que te faz lembrar aquela pancada despropositada na porta, ou janela deixada aberta por acaso, como se estivesse lá apenas para te fazer ouvir um irritante:
- Doeu? Ainda mais despropositado ao qual adorarias responder sem a polidez convencional:
- Queres experimentar, seu despenteado mental? 

quinta-feira, 16 de agosto de 2012

Está carente? Comente na web!


Hoje, todo mundo conhece a fórmula Web = Visibilidade/Atenção. Claro que aqui não se pretende discutir o tipo de atenção, que se busca  e menos ainda, que se recebe, mas apenas aproveitar para apregoar, desinteressadamente, que a fórmula funciona, que é uma beleza!
Como todas as fórmulas, essa também tem as suas variantes, mas eu adoro sobretudo a do “efeito aniversário”, que é em minha opinião, de todas, a mais interessante. Mal começa o dia e a pessoa mais solitária e mal-amada, se for a aniversariante, torna-se um poço de atenção. Mensagens nostálgicas chegam sem parar, trazendo lembranças de situações de que a pessoa tem dúvidas de que um dia realmente existiram. Amigos de infância reaparecem, tentando convencê-la de que jamais foram embora e que sempre estiveram torcendo por si, pelo menos em pensamento, e ela, tão hipócrita quanto eles, engole a elogiosa mentira e retribui com um “igualmente obrigado” ainda mais mentiroso.
Os ex fazem-lhe arrotar um simultaneamente desdenhoso e orgulhoso “só agora?”, por enviarem aquelas mensagens de pedidos de desculpa (duvidosos) pelas promessas de amor eterno, que ficaram por cumprir, ou onde testam a sua dignidade, com propostas vergonhosas de um “me perdoa!” perigosamente promíscuo e inoportuno, por causa de um perfil, que lhe faz parecer mais feliz e realizada do que nunca, graças ao photoshop, que guarda milagrosamente, as rugas das desilusões crônicas fora do mundo virtual, onde uma vida assustadoramente real não dá tempo para fantasiar um status, que lhe faça parecer mais legal e divertida.
Os vizinhos que quase não lhe cumprimentam na vida real, aproveitam para cutucar ou fazer solicitações no cityville e os colegas, por alguma razão obscura, trocam a palmadinha nas costas por um “gostei” em cima dos posts, que proliferam de forma viral em seu mural, deixando-lhe a tarefa de copiar e colar o “obrigado pelo carinho”, apenas para garantir que ninguém se sinta rejeitado. E se esquece propositadamente, que enquanto o número de visitas ao seu perfil aumenta, os abraços se tornam cada vez mais escassos, deixando-lhe espaço para mais e mais comentários na net.

quarta-feira, 15 de agosto de 2012

Angola me cansa!


Sou como milhares de angolanos, que mais por orgulho do que por um patriotismo verdadeiro, desconsideram as acusações sobre corrupção de que se ouvem falar em noticiários sensacionalista de cadeias televisivas estrangeiras, que não medem esforços para arrastar o nosso “bom nome” aos lugares mais desonrosos das listas, que qualificam os países pelo grau de honestidade e transparência na gestão pública. Porém às vezes, esse patriotismo mal informado é suplantado e posto à prova por várias situações, que somos obrigados a suportar em lugares públicos e mesmo privados. Não interessa se se trata de um cartório, um aeroporto, ou o cúmulo, uma esquadra de polícia. Sempre encontramos o espectro de uma corrupção assombrosa, tão frequente que quase se confunde com um procedimento normal e obrigatório; e se antes as pessoas, sentiam-se inibidas a oferecer subornos, hoje em dia, a coisa é escancarada e sem o mínimo de escrúpulos. Os próprios funcionários negociam infracções para garantirem no final aquele argumento que parece a única saída legal: “você me ajuda e eu te ajudo”. E quando isso acontece, não há muito a fazer pois, é sempre num timing perfeito, ou seja – tu, cidadão, desesperado, perdido, ou tão atrasado, que não te resta mais nada senão ceder, porque Infelizmente, quando há urgência e desespero a falarem mais alto, não existe sopro de bom senso, que nos sirva.
Normalmente a coisa começa com as pessoas esvaziando-se em argumentos razoáveis, passeando entre uma humildade previamente ensaiada e uma arrogância desnecessária dos agentes  e outros funcionários descaradamente corruptos, que parece formarem uma espécie de corredor polonês ao qual tu és obrigado a submeter-se, distribuindo gasosas vergonhosamente míseras, que para nada mais servem do que acabar com a tua própria dignidade, já que, ao que parece, expressões como: dignidade, honestidade e zelo não cabem nos vocabulários desses facínoras.
E então, o pobre cidadão, na ausência de qualquer possibilidade de reclamação submete-se resignadamente, guardando sua insatisfação com esperança de usá-la contra alguém, que venha um dia destes a precisar também dos seus préstimos. Generalizando-se desta forma uma estranha experiência de angolanidade, ostentada com um orgulho burro, que se baseia numa espécie de desfuncionalidade estrutural.