segunda-feira, 26 de dezembro de 2011

Anormal como a maioria


Tenho a impressão de que hoje em dia, a normalidade é uma epidemia, uma doença, que se espalha de forma descontrolada, causando entre outras coisas, uma despreocupação crônica com a realidade, uma falta de sensibilidade em relação a tudo que acontece longe do nosso quintal, nos mantendo anestesiados diante das notícias que usam a desgraça alheia como meio para aumentar a audiência e faz as pessoas sujeitarem-se a viver numa uniformidade induzida pela necessidade desesperada de conforto e segurança. Os poucos que se deram conta disso tentam por esforços isolados automedicar-se com atividades que quase sempre são atestadas como desviantes, marginais, ou ainda, comportamentos indesejáveis e potencialmente perturbadores da ordem social e quando isso acontece, temos os psiquiatras e psicólogos, prestando, de forma “abnegada”, o seu trabalho, catalogando e psicopatologizando todos esses comportamentos através de diagnósticos, descrições de doenças e sintomas propositadamente inacessíveis aos leigos, atestando dessa forma a autenticidade dos seus pareceres e reafirmando a sua autoridade médica.
Para garantir a certificação dessas teorias, os cientistas se põe solicitamente ao serviço da sociedade, promovendo pesquisas supostamente objetivas, que servem não só para comprovar a veracidade dos diagnósticos, mas para dar o cunho de verdade, que ainda esteja em falta nalgumas formas de atuação dos profissionais envolvidos na árdua tarefa de manter esse obsessivo padrão de normalidade. Algumas vezes abrem-se convenientes exceções nestas teorias para descongestionar as cabeças de algumas pessoas do peso de consciência gerado por medidas impopulares ou guerras injustificadas, servindo também para racionalizar sobre a legitimidade e a lisura de suas intenções. Assim, enquanto vivermos nessa normalidade patológica, não faltarão minorias descriminadas, mas esperemos que pelo menos isso sirva para nos lembrarmos do seguinte: a normalidade é cultural e relativa!

domingo, 4 de dezembro de 2011

O último revolucionário


Ninguém é mais revolucionário do que um recém nascido, ele não tem medo de nada, é tão corajoso que lembra os heróis dos filmes épicos, que não se importam com o risco, apenas vão à luta e praticamente atiram-se às espadas alheias guardando para si mesmos, apenas a promessa de uma morte honrada e patriótica. Eles também são um bom exemplo de como deve ser uma verdadeira democracia, onde os menores são servidos pelos maiores. As pessoas trocam-lhes as fraldas, dão-lhes de comer e os protegem com uma abnegação admirável, eles sim, exercem o seu direito à liberdade de expressão e isso talvez seja o mais fascinante, não se deixam enganar e berram, literalmente sempre que sentem os seus direitos desrespeitados. Infelizmente, enquanto crescemos, desaprendemos todas essas coisas  e nos deixamos convencer que deixar de exigir os nossos direitos é falta de educação, ou ficamos melindrados com justificações incoerentes sobre a prestação medíocre da governança, que se defende com o nosso desinteresse na participação da vida pública, ou com a nossa ignorância sobre o funcionamento de algo tão complexo, quanto a máquina organizativa do Estado, que é com certeza muito diferente de tudo o que estamos acostumados a gerir, mas quando essa falácia já não é suficiente, nos convencem que somos especiais e que isso é a única coisa que realmente importa, apenas para não berrarmos tanto quanto crianças birrentas dispostas a fazer passeatas, marchas e manifestações que ameaçariam aquilo que eles consideram segurança pública, que nada mais é do que uma tranqüilidade ilusória, já que tudo que a mantém depende de uma formatação generalizadas e propositada das nossas cabeças, algo que é alimentado por uma ignorância crônica e um medo injustificado de berrar que nem bebês, afinal, eles são o último de exemplo de um verdadeiro revolucionário.