sexta-feira, 13 de abril de 2012

Perguntas ridículas sobre África


Pela milésima vez, alguém perguntou-me: 
- África é um país com muita miséria né?
Fiquei com vontade de gritar: 
- Vai pra puta que o pariu! Mas minha boa educação só permitiu um silencioso: vai à merda, seu energúmeno desinformado! 
Tenho que dizer, cansei-me de pessoas que não se dão ao trabalho de avaliar os sensacionalismos noticiosos que não param de apresentar com um pessimismo doentio e inconsequente acontecimentos corriqueiros, ou que se esforçam em passar imagens completamente ilusórias e desinformadas de realidades que não conhecem, tornando as pessoas cada vez mais quadradas, porque se deixam convencer pelas novelas e programas de audiência que apresentam uma África reduzida à pobreza. 
Para princípio de corrida, é só visitar um mapa para saber que África é um dos cinco continentes (imaginem se fosse muitos mais), não é um grande país, ou uma enorme república ditatorial onde todos falam a mesma língua, habitada principalmente por negros gigantescos, pretos como o breu, pouco instruídos e menos inteligentes, preparados desde crianças para serem atletas que participam de maratonas pelo mundo afora e que ainda precisam do paternalismo ocidental para cuidarem das suas vidas. 
Ninguém tem leões como animais de estimação acorrentados como cachorros no fundo do quintal e os safáris não fazem parte do nosso quotidiano, aliás, nem são áreas  residenciais, mas reservas naturais que servem para a proteção dos animais e como recurso turístico e não um campo de férias. Por isso, não temos um único presidente nem uma cultura africana homogênea, somos um mosaico étnico-cultural e linguístico de nações (leia-se países) diferentes e autônomas com línguas oficiais e constituições próprias. E se alguém viveu em árvores, deve ter sido muito antes de termos ocupado o continente. Hoje, partilhamos e usufruímos das mesmas revoluções tecnológicas que o resto do mundo. Temos os mesmos problemas políticos, econômicos e sociais, que qualquer outro país e mantemos a nossa soberania muito bem obrigado! 

sexta-feira, 6 de abril de 2012

Malditos otimistas


Nada pior do que um otimista. Digo isso porque já fui um e até pouco tempo, tive vários amigos que o eram. Eu não sabia quão difícil é entender como aquele sorriso constante e aquela áurea aparentemente inesgotável de positividade às vezes é irritante. Algumas pessoas talvez não tenham parado para pensar no fato de que existem momentos em que gostaríamos de ser pessimistas, de nos esgotarmos com sonhos e premonições assustadoras sobre nossa vida profissional, emocional e social, sem que venha o safado do otimista para nos mostrar como a vida é bela e como nos esquecemos com frequência de aproveitarmos os pequenos milagres como o simples respirar, ou de absorver as positividades cósmicas que proliferam no ar. Quando depois de uma corrida desenfreada para pegar o ônibus, tropeçamos e ainda assim não conseguimos pegá-lo, sendo obrigados a engolir a vergonha e a poeira que nos sobrou da queda despropositada, nos achamos no direito de praguejar, antecipando-se às outras possíveis desgraças do dia; e lá vem mais um otimista qualquer, lembrando-te quanta sorte tiveste em não ter quebrado a perna na queda e que talvez, não ter entrado naquele ônibus tenha sido uma providência divina. Claro que ao ouvir isso tens todo o direito de engendrar de forma silenciosa, é claro, um plano para esganar o camarada, ou ao menos podes torcer para que ele se engasgue em algum canto de seu otimismo tirânico, o que te faz gastar um tempo desnecessário e talvez faça com que te atrases ao serviço, sabendo que vais ser por isso, obrigado a trabalhar em cima de uma falta , que o déspota do seu chefe não aceita justificar. Começas então a maldizer o desconto no salário, que na certa vais sofrer, aproveitando dessa forma, mais uma vez, o direito de barganhar; antes daquele sorriso anarquista, que tenta te convencer que a vida é feita de altos e baixos e talvez o chefe seja bonzinho a ponto de esquecer isso e nem te descontar; e como se não bastasse, ainda vem aquele conselho obrigatoriamente otimista: “faça uma cara mais alegre”. Isso faz-nos perceber que aos poucos vai-se tornando cada vez mais difícil ser pessimista e isso vai criando um aperto por dentro, deixando-nos tristes e cabisbaixos, quando oportunisticamente aparece alguém disposto a tirar-nos o gozo de parecer um coitadinho, recebes uma, duas, três palmadinhas amigáveis nas  costas e um irritante: a vida é mesmo assim, mas é preciso pensar positivo”. Nessa altura normalmente já se tornou insuportável respirar o mesmo ar que essa gente e para não sufocar, eu procuro desesperadamente alguém que não seja tão irritantemente otimista.

quinta-feira, 5 de abril de 2012

A filosofia dos legumes


Meu amigo que gosta de inventar conjecturas disparatadas para falar sobre as coisas que acontecem conosco, apareceu-me recentemente, com a filosofia dos legumes, uma ideia engraçada, mas interessante. Comparou a nossa vida a um prato de comida e lembrou-me que muitas vezes, enquanto crianças fazíamos a nossa revolução no prato. Claro que fiquei confuso. Ele percebeu pela minha cara de peixe estragado e explicou didaticamente o que pensava, começando por me lembrar como as crianças, geralmente têm problemas com os legumes, elas não gostam e só comem por causa da ditadura das mães, ou da corrupção dos pais. Mesmo assim, elas sempre calmas e tentando fazer o menor alarde, separam no próprio prato o repolho, a cenoura, o espinafre, o tomate, etc., fazendo sua revolução silenciosa, separando o que gostam, do que não gostam, sem discursos inflamados de indignação, ou gritos fanáticos contra quem cozinhou. Elas entendiam  que é um vício frequente condimentar a comida com aquelas especiarias e por esta razão não havia muito a fazer senão esperar ter a oportunidade para separar o que realmente lhe interessava. Por isso, segundo o meu amigo, devíamos aprender com as crianças e ao invés de passarmos a vida a gritar histericamente por quase tudo e até por aquelas coisas, que mesmo mudando não influenciariam ou influenciariam muito pouco nossas vidas, talvez fosse mais inteligente passar a separar (silenciosamente) os legumes da nossa vida, em silêncio, sem aquele alarde costumeiro,  que na maioria das vezes apenas serve para chamar atenção da cozinheira tirana.