sexta-feira, 24 de junho de 2011

Por que odeio aniversários

Nada mais nostálgico do que um aniversário depois dos 20 anos. Você volta ao tempo de criança, quando quase parece que o aniversário nem é seu. Alguém trata de organizar tudo por ti (mas não necessariamente pra ti) levando uma série de coisas que você nem sabe para que servem. A casa se enche de crianças que não conheces. Filhos de colegas e amigos, dos teus pais e enquanto todos vocês são obrigados a contentar-se com doces e salgados bem racionados na varanda, ou em qualquer lugar que não tenha nada para quebrar, os adultos se esbaldam na sala ao lado, aproveitando muito mais a festa do que dono dela, e na hora do bolo, além de seres obrigado a dividi-lo é sempre um adulto quem define o tamanho.
Todas essas recordações fazem te contorceres na cadeira, enquanto festejas com os teus amigos os teus vinte e tal, inflamado com discursos de falso orgulho por te sentires mais maduro agora que tens que trabalhar para sustentar a ti e à tua magnífica família, isso momentos antes de um dos teus amigos fazer aquela piadinha sadicamente sarcástica sobre a idade, ou uma das tuas amigas disparar maliciosamente que para pessoas “maduras” como nós, já não sobra espaço para erros, porque já não somos jovens e irresponsáveis como nos tempos de faculdade e para rematar, como se tivessem combinado fazer te sentires mal, outro, irritantemente mais jovem dá-te aquela palmadinha nas costas enquanto sussurra maliciosamente ao teu ouvido: - juventude é uma questão de espírito, como se você ainda fosse aquele adolescente ingênuo que apenas deseja para o aniversário: uma namorada ou a oportunidade de ir às matinês dançantes e perder-se na sensualidade que acabou de descobrir nas mulheres.

quarta-feira, 22 de junho de 2011

Minha modesta honestidade

Às vezes acordamos com a idéia de que somos  melhores que todos os outros que conhecemos – mais inteligentes e generosos, mais solidários e honestos, etc., o que nem é errado, afinal faz parte da nossa vaidade narcísica e desde que não contemos à ninguém que pensamos tudo isso, não precisámos de nos preocupar. O importante mesmo é manter em segredo esse orgulho que apesar de muito saudável pode ser mal interpretado fazendo-nos parecer arrogantes ou porcos chauvinistas se formos homens. Por isso, quando essa convicção se torna forte demais, decidimos fazer alguma coisa para provar como somos tão bons camaradas, como nos preocupamos com o resto do mundo. Então começamos por aqueles gestos que na maioria das vezes não fazem a menor diferença como apagar o cigarro antes de jogá-lo ao chão, esvaziar completamente a lata de refrigerante antes de tentar um arremesso falho na lata delixo, que até não está tão distante, ou colar o chiclete debaixo do banco para que ninguém pise nele. Nestes momentos nos sentimos orgulhosos porque temos a certeza de estarmos a fazer coisas que não dependem apenas do bom senso mas que se devem principalmente a nossa magnífica mente intelectual e consciência de que é com gestos insignificantes que evitamos grandes catástrofes como o aquecimento global, degelo dos glaciares, fome mundial, etc, mesmo sem saber exactamente como é que isso acontece, até porque os órgãos de comunicação não param de falar desses heróis invisíveis de que o mundo precisa, que participa de lutas políticas e se diz neutro, grita palavras de ordem que nem ele mesmo entende, na maioria das vezes e sobre as quais não se perguntou o essencial.

terça-feira, 7 de junho de 2011

Passado, tecnologia e saudade

Todos acharam que o mundo seria melhor, depois do século XIX, com a torrente de descobertas e mudanças de crenças mesmo em relação àquelas coisas em que isso parecia impossível. Surgiram idéias arrojadas e as pessoas esqueceram momentaneamente aquela arrogância religiosa, que considerava heresia, tudo o que a sua sagrada ignorância não deixava entender. O mundo tornou-se um laboratório da ciência e nada mais podia ser anormal, apenas: pouco estudado, com resultados inconclusivos ou parte inicial de pesquisas ainda em andamento. E enquanto os nossos cientistas se propunham a mudar por completo todo o sistema de coisas que conhecíamos - resultado da nossa parca compreensão do mundo -, o próprio homem deixou de ser, aos olhos desses mestres-cuca, aquele que caminhava em direção a algum lugar transformando-se num paradigma heurístico dos processos biopsicossociológicos, que só agora dava aqueles passos tão necessários em direção à perfeição.
A maior parte passou a acreditar entusiasticamente, que se tinha sido possível evoluir até ao homo-sapiens, é porque estávamos destinados a muito mais.
Na verdade evoluímos, mas ainda precisamos de um cérebro maior para absorver todas as obscenidades, que a sociedade atual produz, ou um corpo assexuado, o que daria o suporte biológico necessário para fazer a humanidade compreender, que a emancipação da mulher é antes de tudo uma necessidade evolucionária. Sem dúvida precisaríamos também de escamas para proteger-nos da destruição da camada de ozônio e livrar-nos das emoções que tanto atrapalham na tomada de decisões, mas o melhor de tudo seria banir definitivamente o contato físico, o que nem seria difícil, já que os celulares, junto com outras facilidades como a internet têm-nos ajudado muito a perceber como ele é desnecessário e dispendioso. Talvez não tarde muito para que várias outras coisas possam ser feitas por essa via, afinal, já temos o sexo virtual, uma forma de relacionamento moderna, que tem facilitado muito a vida social do ser humano. Menos constrangedor, menos sujo e sem dúvida, mais saudável e seguro.