quinta-feira, 30 de dezembro de 2010

Coisas que não mudam nem a pau

As tecnologias aumentaram a proporção de alimento por ser humano, mas ainda assim, vários morrem à fome, há mais livros a serem produzidos diariamente, mas persiste uma população enorme de analfabetos e o excesso de informação veiculada nos órgãos de comunicação que a disseminam como nunca, não evitou que as pessoas se tornassem cada vez mais ignorantes, enfim, insuflamo-nos  com discursos que atestam uma necessidade enorme de evoluir, mas ao mesmo tempo aceitamos com um prazer sádico os desrespeitos que nos são impostos de formas inimagináveis. Talvez ainda vivamos numa época em que o desejo de melhorar tem que ser obrigatoriamente frustrado por uma grande necessidade de manter a desordem, que pela passividade com que ela é aceita e pela sua recorrência, só pode ser genética e assim, apenas assim, a TAAG faz todo o sentido, mantendo o ciclo vicioso do “siga-me e não me perguntes porquê” onde as pessoas se convencem com pedidos hipócritas de bom senso e aceitam religiosamente justificações que muito dificilmente fazem algum sentido, por menos certo que isso pareça.

quarta-feira, 29 de dezembro de 2010

Tás a ir, agora aguenta!

Eu me divirto observando as diferenças entre as pessoas e grupos, e com o tempo aprendi como é interessante olharmos para elas, pensando no que nos querem dizer. E digo isso sem pensar na língua. Há características que são bem mais idiomáticas que o próprio idioma. As minhas preferidas são as frases de efeito, elas revelam muito sobre como determinado grupo pensa, de que forma vive ou como operacionaliza o seu quotidiano, ou melhor ainda, como resolvem os seus problemas. E mesmo que na maior parte das vezes isso pode apenas parecer uma brincadeira desinformada, revela algo, senão sobre os outros, pelo menos sobre nós mesmos.
Por exemplo, o “dolce farniente”, ou o “primo comere depo filosofare” faz-me gostar dos italianos. Na minha opinião, isso explica muita coisa. E nos faz entender melhor a pizza e o macarrão. Porém, acho estranho o “Le sefardi” francês, porque faz-me logo pensar em homens barrigudos de gorro e casacos de malha passeando ao lado da torre Eiffel ou fazendo filas pachorrentas no louvre.
Sem dúvida a “time is money” reflete o espírito dos ingleses. Aquela pontualidade lendária quase esquizofrénica e a organização praticamente obsessiva. As boas maneiras e outras coisas pelas quais são conhecidos e que os convencem de uma das maiores ingenuidades biológicas, (que têm realmente sangue azul).
A disciplina oriental que é difícil de explicar a não ser pelo medo quase irracional de ficar em segundo lugar, mas mesmo assim, não tão hilária quanto o “geitinho brasileiro” para quase tudo e a utópica ideia de que não há o que não se resolva se apelares para ele. Entretanto, nada tão criativo quanto o “Tás a ir, agora aguenta” que apesar de ter surgido apenas para Taag não deixa de ser uma maneira interessante de falar dos valores angolanos. Onde parece que as pessoas não passam de vítimas sequestradas pelo sídrome de Estocolmo. Ou o costumeiro “deixa estar”, que serve para quase tudo o que por algum motivo não se resolve nunca. Ou o não menos frequente “isso é Angola” que diz quase tudo sobre o país da maneira mais eufemisticamente criativa, deixando propositadamente de falar de coisas que causariam vergonha e que sustentam os discursos politicamente correctos do pobre, mas com dignidade, esquecendo-se que na maior parte das vezes é difícil eles coexistirem.

quarta-feira, 15 de dezembro de 2010

Filosofias de botequim

Sou apaixonado por conversas de botequim, pois são uma boa oportunidade de discutir vários assuntos de maneira muito despojada. Não é por acaso que são conversas de boteco. De vez em quando participo dessas rodas e me masturbo com teorias ridiculamente insólitas e quase sempre me sinto um verdadeiro fundamentalista numa aula sobre como construir sua própria teoria de conspiração. Mais interessante de tudo, é que normalmente é possível saber quem são as pessoas à volta só pelos assuntos que elas escolhem. Solteiros se empenham em falar da sua vida sofisticada, de como prezam a sua independência, escondendo convenientemente a frustração da sua vida solitária. Casados se gabam da pseudo-genialidade dos seus filhos, e parece esquecerem-se propositadamente que o mínimo que se espera de uma criança com 8 anos é que seja capaz de correr, falar e comer sozinha. Divorciados ressaltam orgulhosamente como é bom voltar a ser solteiro e que pagar a pensão para a “Ex” é um pequeno preço pela dádiva da liberdade. Eles mentem descaradamente sobre não desejarem nunca mais voltar a casar.
Infelizmente é quase impossível descobrir sobre o que as mulheres falam, mas com certeza elas debocham da vida patética dos homens tratando de ressaltar como as suas são tão cheias de sentido, e claro, nunca deixam de falar de roupas, sapatos e compras de cada vez que a conversa parece não prosperar.
Os assuntos fazem um rodízio desnecessário e a profundidade da conversa depende diretamente de quantas rodadas já se consumiram, entre uma e outra, dá para ouvir filosofias interessantes sobre os temas mais importantes da nossa sociedade como a diminuição da popularidade do casamento, principalmente desde que os homens descobriram que não precisam casar para copular, e desde que se criaram os bancos de esperma para as mulheres, onde felizmente agora é possível ter filhos que parecem um nú artístico, com todas as qualidades que existem apenas no imaginário feminino (mais inteligentes, mais lindos, mais sensíveis, mais humanos, mais saudáveis, mais etc) e sobretudo, que não sofrem a influência tão destrutiva do pai.