quinta-feira, 8 de agosto de 2019

O ponto "G" do IVA

Tenho a impressão de que na maioria das discussões públicas sobre grandes questões da vida angolana, há uma tendência para desviar a atenção daquilo que é realmente importante sendo redireccionadas para debates periféricos.
A estratégia seguida parece ser a seguinte: surge um grande problema social, econômico ou político e a discussão é automaticamente encaminhada para uma direcção que por mais relevante que à princípio possa parecer é na verdade uma distração, que pode aparecer na forma de uma nova futilidade social (tipo, as dívidas de um antigo jogador, a jarda infeccionada da sicrana, a sensação do novo casal de famosos, etc.), ou de um debate recheado de superficialidade.
Seria, portanto necessário, nos aventurarmos a fazer uma análise mais cuidada, para descobrir que fomos ludibriados e neste caso, quando acordamos para a discussão que de facto vale a pena ter, já é tarde. Leis foram aprovadas à socapa, projectos que já se sabia que não levantariam vôo passaram sem causarem a justa e devida indignação e por aí vai.
Minha suspeita inclusive é de que esteja a acontecer exactamente a mesma coisa em relação ao IVA. Se propositadamente ou não, a verdade é que nos últimos meses iniciou-se uma frenética discutição (como dizemos na banda) sobre a implementação do IVA. Mas a discussão parece circunscrita à apenas uma palavra, custo (custo para comerciantes, custo para empresas grandes, médias ou pequenas, custo para consumidores, etc) que apesar parecer suficientemente abrangente, não passa de um subterfúgio para afastar-nos daquilo que interessa de facto discutir.
Nessa conversa (que de conversa não tem nada) saltamos etapas. Por exemplo, era importante começar por discutirmos o que vem a ser isso, onde se aplica, qual a necessidade, quais as consequências, mas além dessas preocupações, o problema do IVA transcende, ou deveria transcender a discussão do custo, e para entendermos porquê, precisamos de começar por fazer as perguntas certas.
Antes de tudo é bom entendermos que tratando-se de imposto, a sua centralidade não termina da cobrança, mas no uso. Como qualquer imposto, é fundamental que haja transparência na forma como o mesmo será usado, justamente para se aferir a pertinência do mesmo.
A lógica da existência de um imposto está em pagar uma taxa ao Estado com vista a melhoria de determinado serviço público (educação, saúde, transporte, assistência social, providência social, investigação científica, etc.).
O que temos visto em Angola nos últimos anos, é a despeito do pagamento de diversos impostos e taxas (desde o IRT e INSS ao imposto de consumo) há uma crescente degradação de tudo o que é público e diga-se, sem oferta que se preze no sector privado. Por esta razão, há questões verdadeiramente importantes a colocar, já que burlamos a primeira etapa:
1.     Para onde vai o IVA, educação, saúde, transporte público, pesquisa?
2.     Que percentagem da arrecadação deste imposto será aplicada em cada um destes sectores?
3.     Como será a redistribuição do IVA ao nível local (províncias, municípios, sectores, etc)?
4.     Em suma, de que forma concreta o cidadão beneficiará com a implementação deste imposto?
É claro que podíamos continuar formulando questões relacionadas às já colocadas, mas a chamada de atenção é que se os impostos são cobrados para melhorar serviços públicos, então precisamos que seja dito de forma transparente qual será o destino do IVA. Há exemplos nesta direcção que podemos aproveitar de experiências internacionais.
No Brasil, por exemplo, segue-se a regra de utilizar parte do valor arrecadado pelo ICMS (Imposto sobre a Circulação de Mercadorias e Serviços) investindo em  políticas públicas sociais para educação, saúde e segurança. Deste modo áreas como: cultura e desporto, energia e inclusão social beneficiam directamente e de forma mais transparente possível do imposto cobrado pelo estado. Usando este imposto o Governo do Estado de São Paulo, criou a Lei de Incentivo ao desporto, o ProAC ICMS de incentivo à cultura (cinema, teatro, dança e etc.), e  pessoas com deficiência beneficiam-se da compra de veículos adaptados às suas necessidades. 
Como estamos acostumados, os projectos governamentais são impostos arbitrariamente, mas desta vez, talvez devêssemos mobilizar-nos para obrigar o Governo e quem sabe os deputados a discutir não a implementação ou não IVA, que essa me parece uma batalha perdida, mas como o mesmo beneficiará os contribuintes, para o melhoramento de que serviços está destinado, pois este parece a meu ver, o ponto “G” do IVA