Não há praga maior do que as filas.
Difíceis de controlar, praticamente impossíveis de erradicar, mas não há como negar
sua utilidade, pois fornecem indicadores interessantes sobre um país e são de uma proporcionalidade fantástica. Veja que, quanto menos desenvolvido o
país, tanto maior a crença da população de que elas são o melhor exemplo de
sociedade organizada.
Falam sobre o nível tecnológico de uma
nação, por exemplo, se as pessoas precisam de acordar quatro horas antes do
expediente para entrarem numa fila incompreensivelmente longa, apenas para ter acesso a algum serviço público, é por que o país ainda não é muito avançado.
Se as pessoas continuam a preferir este
hábito (ou vício, dependendo do caso) suburbano apesar do atendimento ser dependente
exclusivamente de uma senha eletrônica, é por que a ignorância informática ou
nível de analfabetos é provavelmente muito maior do que as
estatísticas mentirosas do governo apresentam. Porém, não podemos
negligenciar seu alto valor antropossociológico, afinal, as mesmas servem para garantir a tão benfazeja
socialização das mulheres, proporcionando-lhes alguns momentos de uma cartase
saudável e gratuita ao fofocarem sobre o vizinho que não imagina que é corno graças
a demora na fila do ônibus. Matondelo, um
psicólogo famoso da universidade de Broblim também ressalta a sua
importância no aumento da autoestima da menina do caixa do supermercado, que
graças a esse artifício social despropositado, ganha xavecos improvisados em
cima das listas de compras, enfim, sem elas talvez não saberíamos o que seria
beber e fumar socialmente. Aliás, há mesmo uma teoria que diz que homens e
mulheres de países subdesenvolvidos são mais felizes, porque eles têm na fila a
oportunidade de xingar sem medo de represálias aqueles que atrapalham esse tipo
de organização. E não é por acaso que os maiores índices de pobreza estão nos
primeiros, aliás, os economistas descobriram que quanto mais tempo as pessoas
passam nas filas, tanto menos tempo passam a trabalhar (são um bom indicativo
de produção de um país) e os atendentes conhecem a situação, por isso as filas
são longas e demoradas demonstrando a sua solidariedade com os clientes. Infelizmente
muita gente não compreende e se exaspera profundamente com a lendária
morosidade das filas, esquecendo-se que graças a elas, evitam expor-se a situações
potencialmente perigosas como a possibilidade de serem seqüestrados na sua
própria casa.
Recentemente comecei a perceber que elas também
são importantes fontes de informação sobre os serviços de determinado local.
Por exemplo, a da padaria diz que o pão até não é tão bom, mas é barato, a do
banco, quanto maior a fila, melhor a política de crédito, já a do hospital,
trás duas mensagem bem claras: se estiver às moscas é um péssimo hospital, ou
caríssimo; se estiver superlotado, é ótimo para pobres. É bom lembrar que não
há uma melhor que a do talho, entre uma e outra lição de anatomia para donas de
casa, você ainda se deleita com as melhores estórias da vizinhança, por outro lado,
nenhuma é tão irritante quanto a de uma repartição pública. Tu esperas por
horas a fio e quando chega a tua vez sempre falta mais um documento, uma assinatura
ou a boa disposição da funcionária, que é sempre gorda, rabugenta e de
inteligência medíocre, mas que se acha a gema.
Engraçada mesmo é a fila do chapeleiro, e
do provador da loja de roupas, todos esperando desesperados pela sua vez de despir-se.
Poucas são tão disputadas como a do bar, sobretudo se o barman for uma mulher
(os donos de bares descobriram isso a que tempos).
Tem também as filas sazonais, por elas
podemos dizer em que dia do mês estamos, como as do salário, as das vésperas do
natal, páscoa e dia das mães, ou a eleitoral, que no Brasil quer dizer que
estamos em época da copa.