A maior parte de nós tem a certeza de
que vivemos na época do ter e não mais do ser, pois, antes o importante era ser,
seus vizinhos, amigos e parentes, esperavam conhecê-lo pelo caráter e
personalidade. As pessoas eram descritas por fórmulas como: o fulano é
confiável e prestativo; o beltrano é um cara abnegado, esforçado e competente e
a cicrana é honesta, inteligente e diligente, por isso, as referências a
respeito de alguém podiam ser atestadas facilmente pela informalidade do
boca-a-boca daqueles que conheciam ou conviviam com tal pessoa.
Depois deste tempo surgiu a época do ter,
quando as coisas começaram a tornar-se difíceis. As pessoas passaram a ser medidas pelo que tinham, suas posses
determinavam quem você era, muito mais do que seus valores, virtudes e caráter;
aliás, o significado de todas estas palavras foi redefinido de modos que elas
passaram a estar associadas ao quanto você podia comprar, as coisas materiais
passaram a ser elas mesmas, vistas como valores, nossos carros, relógios,
celulares e outras bugigangas de que tanto nos orgulhávamos, passaram a conter
em si mesmas, nossos valores morais, que em um passado não muito distante,
somente podiam ser investidos nas pessoas. Então, começamos a comprar e
reproduzir absurdos incríveis: ternos passaram a indicar respeitabilidade,
responsabilidade e competência, a marca do carro indicava prosperidade, ou uma
vida bem sucedida, o tamanho do escritório falava sobre nosso espírito
empreendedor e a abastança dos móveis
mostrava nosso alto sentido estético. Mas as coisas não pararam por aí,
pois, como se não fosse possível piorar, estabelecemos a sociedade do Parecer
Ter, onde mais importante ainda do que o Ser
ou o Ter, é o Parecer. Viver das aparências tornou-se um exercício obrigatório e
a opulência que antes já fazia parte do nosso dicionário de vícios, ganhou uma
visibilidade ainda maior, deixou os recantos tímidos de uma vida hipocritamente
humilde para ocupar a sala principal, com a diferença de que agora já ninguém
mais precisava de ter coisa alguma, apenas de descobrir o esquema do parecer.
A infeliz massa de gente desinformada
acreditava, que havia começado uma época revolucionária, pois, acenava-se para eles
com a ilusão de oportunidades iguais, prometendo-se-lhes (mentirosamente), a opulência, que antes era privilégio apenas
de alguns. Inventaram-se assim os cartões de crédito, as hipotecas, os
empréstimos à prazo, os cheques especiais, os pagamentos parcelados com e sem
juros e toda uma gama de artifícios, que
serviam para alimentar esta ilusão. Como consequência, “honra” tornou-se uma
palavra obsoleta sendo imediatamente substituída
por “garantia”, que tornou-se por sua vez, um negócio lucrativo gerido principalmente
por aquelas instituições, que causaram essa inflação de vidas aparentes, porque
para parecer ter é preciso oferecer garantias para as mesmas pessoas a quem se
pagam taxas pesadas para continuar a ostentar essa fantasia ofensiva.