domingo, 22 de janeiro de 2012

Genialidade emprestada


Um amigo disse-me uma vez que “nada impõe mais limitações a um homem do que a falta de dinheiro”. Esta é uma daquelas frases, que você reluta em atribuir a alguma pessoa viva, sobretudo se for alguém próximo, afinal, nada é mais difícil de aceitar do que a genialidade de um ente querido, principalmente se ainda polui a atmosfera contigo, nos almoços familiares e bebedeiras de fim de semana.
A frase apanhou-me desprevenido, por isso fiquei com aquele semblante de novato em praia de nudismo, que não pode admitir a própria ereção por questões de princípios e não se masturba nem mentalmente, com medo de ser descoberto.
Ao me recuperar, pensei: talvez sim, principalmente  numa sociedade capitalista, porque numa socialista, as coisas seriam diferentes. Infelizmente vivemos numa, ou em várias sociedades capitalistas, onde quem não pode comprar, normalmente não pode muitas  outras coisas e dificilmente pode dar-se ao luxo de filosofar sobre a vida, pois não lhe sobra muito tempo entre as longas e fastidiosas jornadas de trabalho.
Quando chega o final de semana, a única reflexão que faz algum sentido para ele é: a que horas é o jogo? Isso quando o peso de consciência não lhe obrigar a dar atenção à família, oferecendo possibilidades de diversão  altamente criativas, (devido a falta de recursos), porque infelizmente, aquelas jornadas semanais pouco oferecem, além de uma identidade trabalhadora precária, uma satisfação ilusória, e uma dignidade mal informada, secularizada por essa tradição que não desconfia da necessidade doentia de trabalhar apenas para pagar contas, uma refinada forma trabalho forçado, que esconde obrigações artificiais, criadas propositadamente para manter o cidadão com aquele sorriso  de dever cumprido, característico da classe “trabalhadora”, que se orgulha de estar a construir uma sociedade pretensiosamente melhor, à custa de uma dignidade alienada.
Depois de todas essas idéias disparatadas, eu cheguei a minha própria conclusão, talvez o problema nem seja a falta de dinheiro, mas a falta de tempo para pensar na própria condição de vida e a ignorância. Mas pode ser que não ter dinheiro também obrigue as pessoas a se manterem ignorantes, o meu amigo teria dito algo sobre isso.

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